Há muito anos, estávamos eu e Miguel olhando pro céu de Itaipava, na rede da varanda - loucos, desarvorados, rindo de qualquer besteira. Quando de repente, uma estrela despencou sobre as nossas cabeças. Sem nenhum ruído, nada. Talvez um rastro luminoso, mas muito breve. Tão breve que mal deu tempo de gritar : -"Olha lá uma estrela cadente !"
E tudo já tinha se acabado.
A solidão repleta de gente é a pior de todas. A solidão dos meninos que nunca aprenderam a crescer.
Quando eu era criança, a minha avó me levou ao Cinema Metro Copacabana, para assistir Quo Vadis. Vovó torcia por Deborah Kerr, a bondosa cristã de túnica azul, que amarrada numa estaca, enfrentava corajosamente uma fera faminta. Eu torcia pela vilã, a bela imperatriz morena, coberta de jóias, que condenava abaixando o dedão, impiedosa.
Anos depois, descobri o nome daquela coadjuvante que encheu meus sonhos por algum tempo.
A atriz se chamava Patricia Laffan e nunca se tornou uma estrela. Mas numa espécie de vingança estranha e compulsiva, eu inventei a sua história : ela se casou com um homem bom, o bonitão da turma, que a amava desde os tempos da escola. E que sempre esperou por Patricia, até que ela se cansasse da carreira.
Então construiram juntos um futuro de felicidade, uma vida em Technicolor.
Patricia Laffan e Peter Ustinov em Quo Vadis
Patricia Laffan na verdade nunca soube que as estrelas não gritam quando caem. Ela foi mais esperta, pulou fora antes do fim.
Ou talvez ela tenha entendido uma verdade tão dolorosa quanto definitiva : estrelas cadentes não gritam, porque há muito tempo perderam a voz, cansadas de tanto gritar por socorro.